Nos últimos anos a nutrição ganhou visibilidade em diversas áreas da medicina. Se muitas vezes ficou circunscrita às questões de controlo de peso, é hoje reconhecido que restringir o papel da nutrição meramente a essa dimensão é altamente redutor. E a área da gastrenterologia é um exemplo perfeito disso. Não só porque é no sistema digestivo que assenta a capacidade de o organismo digerir e absorver nutrientes, mas também porque é ele que alberga o órgão cujo verdadeiro impacto na saúde humana é ainda desconhecido, mas altamente promissor – a microbiota. Neste domínio muitos “eixos” têm sido propostos, entre eles os eixos gut-brain, gut-liver, gut-eye, gut-joint…… e isso não é de estranhar. Diariamente, minuto a minuto, a barreira intestinal contacta com uma enorme variedade de nutrientes, naquilo que é o seu papel absortivo, determinante para um bom estado nutricional, mas também enquanto entidade secretora de hormonas, neurotransmissores, tão importantes para a saúde geral do individuo. A qualidade da barreira intestinal é influenciada pelas bactérias que no lúmen habitam, e ambos (barreira e bactérias) são altamente dependentes dos alimentos que ingerimos. A evolução do conhecimento nesta temática tem obviamente acrescentado valor e importância à dieta do individuo naquilo que à saúde intestinal diz respeito. Dietas com maior ou menor capacidade fermentativa (FODMAPS no SII), dietas com maior ou menor teor de fibra (influenciadora major da motilidade intestinal, crucial na obstipação ou diarreia) ou dietas que alteram microbiota intestinal, melhoram função barreira e têm efeito anti-inflamatório (nutrição entérica na DII) são exemplos de como a manipulação personalizada da dieta traz benefício no controlo destas doenças. Isto sem esquecer o enorme impacto que a nutrição tem no estado nutricional do doente oncológico do foro gastrenterológico, onde a alimentação ganha obviamente enorme relevo, ou também nos casos de doença hepática ou pancreática, em que estratégias nutricionais personalizadas são o suporte base para alteração de comportamentos do padrão alimentar.
Hoje dia 16 de outubro celebra-se o Dia Mundial da Alimentação, que ano após ano nos relembra o quão fundamental é dedicarmos atenção a algo que é transversal a todos nós – a alimentação. Optar e recomendar a prática de uma alimentação saudável, mas ajustada à nossa condição de saúde é responsabilidade de todos nós.
Catarina Sousa Guerreiro
Nutricionista Clínica
Professora Associada na Faculdade de Medicina da UL
texto escrito a convite da Sociedade Portuguesa de Gastrenterologia